segunda-feira, 9 de junho de 2008

Um dos meus grupos de literatura é formado de pessoas incrivelmente versáteis e criativas. Nossos encontros são pura diversão. Ao final deles, sempre escolhemos vários temas para serem desenvolvidos até o encontro seguinte. Não há necessidade de se escrever sobre todos eles. As pessoas geralmente escolhem somente um e pronto. Na última reunião os temas sugeridos foram: "Viagens" (por causa da viagem à Itália que a Myriam faria este mês), "Ficção Científica" (por causa da peça que a Hada Luz, atriz, está ensaiando - sobre ficção científica) e"Banheiro" (a partir de um comentário que fizemos sobre o filme "O Banheiro do Papa"). Além destes três temas, a Anna sugeriu também que desenvolvêssemos um texto sobre a lei de Darwin que diz: "Quem sobrevive não é o mais forte, nem o mais inteligente, é o mais adaptável."
Catarina, "porralouquíssima" coleguinha nossa, alagoana arretada, resolveu misturar tudo isso e fez um texto surreal, hilário, postado em seu blog www.gavetaverde.blogspot.com. Pegando carona na idéia, resolvi também fazer uma mistura de todos os temas. Foi isso aí que saiu:

A INCRÍVEL VIAGEM DE MÍRIAM
(Ficção científica)

Sylvia Regina Marin

Miriam não sabe. Não tem a menor noção. No entanto, todos à sua volta sabem – seus alunos, seus parentes, seus amigos, os colegas da oficina literária... O porteiro do prédio onde ela mora também sabe (mas isto não chega a ser uma novidade; os porteiros sempre sabem de tudo). Até o jornaleiro da esquina, o dono do bar, os freqüentadores do restaurante em frente e o sapateiro sabem.
O que ninguém tem é coragem de contar para ela. O tempo está se esgotando. É preciso armar uma estratégia com urgência. Pois foi Catarina, logo a mais perturbada das amigas de Miriam, quem teve a brilhante idéia.
- Vamos fazer plantão na porta do banheiro social do apartamento de nossa amiga!
Que “sacada” genial! Como não tinham pensado nisso antes? Difícil vai ser explicar à Miriam a estranha movimentação em sua casa, mas não há saída. Pior seria perdê-la, destinada que está a retornar a seu planeta de origem, na distante galáxia de Markarian.
Pois é... Se os que me lêem por acaso não sabem, Miriam foi trazida à Terra, em um invólucro humano, para aprender como vivem os terráqueos e tentar se adaptar ao nosso modus vivendi. Entre os voluntários que se apresentaram para a terrível experiência, ela foi escolhida por ser a mais forte e mais inteligente. Antes da longa viagem, porém, seus superiores tiveram o cuidado de apagar as lembranças de Miriam e de acrescentar, em sua fórmula, pitadas de sentimentos – amor, compaixão, tolerância, solidariedade – coisas importantes para o convívio com outros seres humanos.
Estipularam um prazo, findo o qual Miriam fará a viagem de volta. O completo êxito da empreitada a tornará a criatura mais poderosa de Markarian. No entanto, se, ao contrário do esperado, ela fracassar, sua arqui-inimiga Lea tomará o poder.
Os amigos sofrem ao pensar no destino da amada Miriam. Combinam entre si que, enquanto viverem, não permitirão que ela entre naquele banheiro. Sua derrota é evidente. Bem que ela tentou, mas como se adaptar a um mundo tão cruel onde existem tantas guerras, tanto ódio, intolerância e desamor? Talvez os markarianos tenham exagerado na dosagem de bons sentimentos, mas agora é tarde. As horas voam.
O tic-tac do relógio de parede, dentro do banheiro, deixa os nervos de quem está de plantão em frangalhos. É ali que está localizado o aparelho que emana os sinais de comando da nave-mãe. O vaso sanitário é uma caldeira em ebulição. Pode explodir ao menor contato com a pele e sugar a pessoa, através dos esgotos, até o ponto escolhido com antecedência para o resgate. A balança não está ali por acaso. Ao pisar nela, toda uma varredura pode ser feita no corpo de forma a limpar qualquer resquício de bondade. Até mesmo o inocente quadro escrito em italiano tem como objetivo disparar raios imobilizadores, se necessário.
É por isto que todos estão atentos. Miriam não entende porque há sempre alguém com dor de barriga, quando ela tenta entrar no banheiro. E, por mais que adore os amigos, que “diabos” aconteceu que essa turma não sai mais de sua casa?
Miriam não sabe; e, se depender de nós, ela nunca saberá.

Junho de 2008

3 comentários:

Anônimo disse...

Sylvia querida ...como vai?
Adorei mais esse seu texto...quem "entre nós" não tem um formigamento no desejo de retorno ao Lar...
Eu sinto saudades de kiron...e vc?
bjs
ana diniz

Beth/Lilás disse...

Piradíssimo esse texto, Sylvinha!
Não sei como você consegue bolar tanta estória, com diferentes temas e personagens.
Beijinho e boa semaninha.

Unknown disse...

gostei!!!!!!!! beijos...