terça-feira, 29 de abril de 2008

Gente, olha aí a Bia fazendo um desenho na escola. Foi na aula do professor Leo, que ensina Ciências Ambientais. Ela estava fazendo o desenho de um bichinho que ele levou (agora não me lembro qual, só sei que o nome era Albertina). Ele leva cada coisa... até uma iguana já foi parar na Studio da Criança.

Hoje vou postar um poemeto. Lá vai:

SUTILEZAS

Sylvia Regina Marin

Gosto quando me encontras
Bela, elegante e charmosa.
Com uma leve maquilagem,
Bem saltitante e cheirosa.

Tu me olhas com admiração
Reparas em minha pele tratada
Com certeza pensas que estou
Feliz e muito bem-amada.

Enfrento teu olhar inquisidor
E levanto a cabeça, segura
Abro meu melhor sorriso
Sem rancor, nem amargura.

As marcas da dor, no entanto,
Estão todas lá, disfarçadas,
Em tramas sutis e enganadoras
Como telas mal pintadas.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Depois de uma semana com dois feriados, imposto de renda para fazer, e assuntos a discutir com meu advogado na cidade, fiquei um pouco atrasada em meus escritos. Em compensação, entrei para mais um grupo literário. Bem, este vai se reunir somente uma vez por mês. Se não, seria difícil dar conta. Além deste blog, escrevo também para o http://versoseacordes.com e para o site www.elianebrasil.com.br. Quem quiser me visitar em outras prais, fique à vontade. Alguns textos naturalmente se repetirão.

Hoje vou colocar um pequeno texto feito em fevereiro, após o Carnava.

ENREDO - SAMBA

Saí da floresta amazônica para conhecer o mundo. Estava semi-nua sim, pois minha tribo ainda não conhecia a civilização. Era um domingo e me lembro do espanto com que algumas pessoas me olhavam. A partir de um certo ponto, porém, já não ligavam mais para mim. Havia gente mais bonita do que eu, com menos roupa do que eu, e quantas luzes ...
Cansada, entrei em um navio com destino à Espanha e adormeci. Acordei na segunda-feira em um lugar exótico, touros correndo pelas ruas e monstruosos seres humanos tentando matá-los. O que aliviou minha tensão foi um grupo de dançarinas de cabelos negros, iguais aos meus, vestidas de vermelho e preto, com sapatos que batiam forte no chão e torcendo nas mãos algo que me pareciam cigarras a cantar. Que alegre visão!
A multidão me empurrava e eu me deixava levar, sem destino. Pois foi assim que, na terça-feira, cheguei à Cote D´Azur, na Riviera Francesa. Na pequena cidade à beira-mar que me acolheu, fiquei surpresa com a quantidade de pessoas diferentes de mim que andavam de um lado para o outro na Croisette. Vários cartazes mostravam figuras de bichos, monstros, gente, flores ... Isto sem falar dos carros alegóricos, que eram a mais perfeita descrição do deslumbramento.
Pulei, dancei, cantei e, novamente exausta, adormeci entre um africano e um toureiro. No dia seguinte, acordei atônita. O ar estava parado, a alegria – congelada; a luz do sol me ofuscava.
- Onde estou? perguntei a mim mesma.
Só então me dei conta da triste realidade: era quarta-feira de cinzas.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Atendendo a insistentes pedidos do meu ENORME fã-clube, aí vai mais um texto de minha autoria.

Observação: por ENORME entenda-se: "Não necessariamente grande, porém de categoria."

CALO DE ESTIMAÇÃO

Sylvia Regina Marin

- Rodooolfo, me dá mais um beijinho?
- Vem cá, minha gostosa, que eu vou cobrir você de beijos.
- Ai, pára, pára, está fazendo cócegas...
- Tá bem. Parei.
- Não. Continua, fofo. Se eu chegar atrasada ao escritório de novo, digo que tive de ir ao enterro de uma tia.
- Isso é mórbido, Lena. Quantas tias você já matou este mês?
- É mesmo. Melhor eu tomar um banho. Mas chega cedo em casa hoje, amor. Mandei a Zefa fazer sua torta preferida, aquela de damasco com nozes. Tenho umas supresinhas também, mas só à noite.
- Ih! Acho que perdi alguma coisa. Não é meu aniversário... Estamos comemorando algo especial?
- Rodolfo, hoje faz exatamente um mês que não temos nenhuma briga.
- Jura? Nem uma pequena discussão? Tem certeza de que há trinta dias eu não falo mal da sua mãe, nem você xinga meus amigos do futebol?
- Tenho. Marquei no calendário.
- Caramba! Nem percebi...
- Desde a última vez que nos desentendemos, percebi o quanto você era importante na minha vida e que não valia a pena a gente gastar energia com bobagem. Você é o meu homem, meu tesão, meu colírio, meu pote de mel, minha fonte da juventude.
- Ah! Leninha, você é que é meu doce de coco, minha mousse de chocolate, meu sorvete de manga, meu pudim de pão.
- Meu pirulito de framboesa!
- Meu pêssego em calda!
- Minha banana caramelada!
- Meu figo maduro!
- Meu ursinho de pelúcia!
- Minha... meu... meu... meu calo de estimação!
- Epa, calo? Aquela protuberância horrorosa, dura, disforme, que incomoda e dói?
- Não, Leninha, calinho de es-ti-ma-ção, que a gente gosta de acariciar e fazer cafuné, quando lateja.
- Se lateja, não é uma coisa agradável; ainda por cima, é visualmente anti-estético e impede o portador do mesmo de exibi-lo quando vai à praia, por exemplo.
- Lena, nós estávamos brincando, esqueceu? Helloooooo!
- Então você estava brincando? Era tudo de mentirinha? O que você quis dizer com “figo maduro”? Sim, porque, se o figo está maduro, já, já ele cai do pé. Quem sabe estou para dobrar o cabo da boa esperança e nem me dei conta.
- Lê, vamos parar por aqui? E nossa comemoração?
- É assim que você me vê: velha, feia, incômoda. Tem vergonha de mim, não é? Seus amigos devem morrer de rir quando fico em casa vendo televisão enquanto a turminha sai para o futebol, o chope, e sabe-se lá o que mais.
- Minha paciência esgotou. Vai, liga agora para sua mãe e pede para ela vir consolar a filhota, tão mal casada, pobrezinha.
- Não ouse falar da mamãe. Sabia que foi ela que me deu a receita da torta de damasco com nozes que você tanto ama, bobalhão?
- Não sabia, não queria saber e, para ser sincero, tenho muita raiva de quem sabe. E tem mais, não suporto esta torta. Eu disse que gostava para agradar você. Odeio nozes. Damasco me dá azia. Sou chocólatra.
- ...
- Lena, não adianta fazer biquinho, nem chorar. Não ligo.
- Quero morrer... Como sou infeliz!
- Deus do céu! Tudo isso por causa de um calo de estimação que nem existe.

Março de 2008

quinta-feira, 17 de abril de 2008


Ai, que saudade do meu blog...

Andei super enrolada esses dias - não escrevi nada. Me encrenquei com uma impressora nova (multi-funcional, modernosa, A máquina). Instalei tudo direitinho, seguindo "ipsis literis" o manual de instalação. Me senti o máximo. Tudo terminado, eu felizinha da vida, o que fiz? Imprimi um texto, é claro. Isto é, tive a sensação de que dei o comando, mas a danada não quis me obedecer. Vejam se eu tenho idade para lidar com desobediências e malcriações... Desinstalei a safada e fiz todo o processo de novo. Nada. Me rendo às evidências. Vou procurar ajuda. Ah! Como era bom quando meu filho morava comigo. Em dois tempo ele teria dado um jeito nessa história. No meio dessa confusão, tive tempo para ir a Teresópolis no final de semana curtir aquela paisagem exuberante da serra, fui à pré-estréia da peça teatral "Ninguém é Perfeito" (prestigiar minha amiga Giovanna Gold, que dá um show), fui ao lançamento do livro "Tijuca em Crônicas" (uma das cronistas é minha amiga Luci), tonalizei e hidratei meus cabelos, e assisti a dois filmes: "Um Plano Brilhante" e "Um Beijo Roubado". Ufa! Recomendo aos amigos o filme do Jude Law ("Um Beijo Roubado", tradução horrível para o lindo original "My Blueberry Nights"). O diretor é chinês (Wong Kar Wai), mas o filme é passado nos Estados Unidos, com interpretações memoráveis do Jude Law (é claro - bem, esse não precisa nem falar, basta iluminar a tela - vamos combinar!), da Natalie Portman, da Rachel Weisz e do David Strathaim.

A fotografia lá em cima é uma foto temática Bia, no parque do Beto Carrero, em Santa Catarina.


quinta-feira, 10 de abril de 2008

Ontem acordei às 6 horas da manhã e fui dormir à meia-noite. Tive um dia cheio. Mas cheio mesmo - de acontecimentos, experiências, constatações e encontros. Foi ótimo. Após árduos anos de trabalho formal, em que era obrigada a acordar entre 5 e meia e 6 horas, tenho me dado ao luxo de ficar na cama até mais tarde. Mas ontem tinha um motivo justo para madrugar. Levei Cecília e Beatriz (filha e neta, para quem não está ligado) ao aeroporto. Cecília está de férias e aproveitou para passar uns dias em Camboriú com a filhota. Bia estava animadíssima com a perspectiva de sua primeira viagem de avião. Tanto que acordou sozinha, ninguém precisou chamar. Fofa! De volta à casa, dei uns telefonemas, tomei algumas providências domésticas e pus o maiô para ir à aula de hidroginástica. Minha turma tem uns 20 alunos - homens e mulheres de idades variadas; mas a maioria é composta de senhoras, à procura de um exercício físico que lhes dê prazer e, ao mesmo, consiga dar uma ligeira enrijecida nos flácidos músculos. Eu sou aluna aplicada. Uso caneleiras, pego pesos, faço tudo que a professora manda, no ritmo devido. Saio sempre satisfeita. Ontem, no entanto, a professora estava tão "atacada", gritando, mandando todo mundo acelerar, aumentando o som, que parei para pensar: "O que estou fazendo aqui?"
Levo anos da minha vida tentando me equilibrar, atingir um estágio de paz interior e me vem essa histérica atordoar minha cabeça e meus sentidos? Desculpem o mau Português, mas "tô fora". É como diz minha amiga Beth, em seu lindo blog Suprema Mãe Gaia, as pessoas perderam a noção das coisas. Em nome de um suposto rejuvenescimento, uma magreza forçada, uma busca irrefreada pelo "belo", tem gente fazendo barbaridades - botando os bofes pela boca nas academias, repuxando o rosto até atingir o sorriso eterno, se arriscando em "lipo-pirações". Arre!
À tarde, terminei um texto sobre "Boicotes" para ler na reunião da noite, do grupo de literatura, na casa da Myriam, em Copacabana. Nossos encontros são um verdadeiro "happening". Pena que a Giovanna Gold, que é atriz, não pôde ir dessa vez - ela sempre dá o tom performático da noite. Já pensei em sugerir que essa oficina literária passe a se chamar oficina terapêutico-literária, porque o que a gente põe para fora não é brincadeira. As idades dos participantes varia dos 20 ao 70 anos. Não é lindo isso? É uma alegria tão grande a nossa troca... Ontem, a Aline, grávida de 6 meses, apareceu. Há tempos ela não ia. Está linda, exuberante, se amando muito e curtindo a barriga de forma extraordinária. Esse encontro amoroso de pessoas maduras com jovens cheios de energia é tão frutífero que vocês não podem imaginar. Às 22:30 h cheguei em casa. Silêncio completo. Marco Antônio já tinha ido dormir. Aproveitei, então, para fazer uma coisa que adoro: sentei no sofá e liguei a TV no "Saia Justa". Adorei o programa, como sempre. Depois dei uma zapeada, vi uns pedacinhos de filmes e fui dormir. Uf! Em boa hora - cansada, mas feliz.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

O tema desta semana da "Esquina Literária" é, vejam só, "Encontros Possíveis". A Lice lançou o tema sem lembrar que era o nome deste blog. Depois, ficou contente com a descoberta e disse que seria uma homenagem a mim, que sou a caçulinha do grupo. Ela é uma fofa. O "caçulinha" é por conta de eu ter sido a última a ingressar no grupo, e não pelos meus 15 (x4) anos de praia.
Lá vai:

ENCONTROS POSSÍVEIS

Sylvia Regina Marin

Marília está só. Literalmente. Os filhos debandaram como andorinhas em revoada - seguiram os caminhos do destino. O marido... já o perdeu faz tempo, enredado pelas tentações fugazes a que a fraqueza humana se expõe. Amigos fiéis? Sim, alguns: Laura, Regina, Pedro, Augusto... Comunicam-se pela Internet. Laura se apaixonou por um holandês e foi morar em Amsterdã. Regina vive ocupada com os quatro netos e, quando lhe sobra um tempinho, só quer saber de dormir. Pedro se casou, no mês passado, com a melhor amiga da filha caçula – anda, portanto, ocupadíssimo. Augusto recebeu uma boa proposta de trabalho e foi morar em São Paulo.
Só. Inteiramente. A companhia de bichos não a seduz. Descarta, portanto, a sugestão da vizinha do apartamento em frente, que insiste para que ela adote um cãozinho, ou mesmo um gato - um porquinho da Índia, quem sabe? Este não é seu esporte favorito. A única vez na vida em que cedeu aos apelos do filho mais velho, e comprou um aquário com peixes, foi um fiasco. Esquecia de colocar comida, de trocar a água e limpar o aquário, enfim... Os animais acabaram morrendo. Eles morreriam um dia, de qualquer jeito, mas não precisava ser por descuido seu, nem antes da hora, não é? Marília ficou três dias de cama naquela época – remorso e depressão.
Só. Irremediavelmente. Teve sua cota de ligações amorosas: algumas intensas, outras escorregadias, amigos que se tornaram namorados, amores de verão, amantes “iô-iô” – é, do tipo que vai e vem – amizades coloridas... Pode-se dizer que foi eclética. As melhores lembranças ficam por conta dos que a fizeram rir muito – qualidade rara hoje em dia. Ah! e de dois homens especiais que, em períodos distintos, que fique claro, foram seus mestres na arte da carícia, do gozo, do prazer incondicional. Pensando bem, não tem do que se queixar. Quantas mulheres ela conhece que podem dizer o mesmo? Mas eles se foram. Por um motivo ou outro, partiram.
Só. Desesperadamente. A turma da faculdade se dispersou. Os colegas de trabalho só falam de futebol, Big Brother, novela e o pagode do fim-de-semana. Por mais que tente, ela não se enquadra. A empregada, que trabalha em sua casa há mais de vinte anos, tem sempre histórias fantásticas sobre roubos, estupros e mortes, que ela não quer ouvir, não quer saber, mas não sabe como evitar. Tudo acontece naquele fim de mundo onde a pobre Isaura se consome de tanto sofrer. Às vezes tem vontade de se sentar à mesa da copa e conversar com Isaura sobre coisas comuns, do dia-a-dia. Mas a conversa é sempre adiada para um momento melhor, em que as duas mulheres estejam mais leves e disponíveis. E esse momento nunca chega.
Só. Ironicamente. Lembra do tempo em que era a aluna mais popular do segundo grau. Não havia festa para a qual não fosse convidada. Era líder de todos os movimentos estudantis e musa dos arroubos literários dos fãs mais exaltados. Que fim levou essa gente? Como se deu a ruptura? Ela nem percebeu... Pede uma escada a Isaura. Abre a porta mais alta do armário de seu escritório e de lá retira uma caixa repleta de fotos e bilhetes. Sorri. Relembra. Emociona-se. Chora. Tem consciência de que é responsável por suas escolhas.
Viveu o que decidiu viver. Teve os encontros que atraiu. Se está só nesse momento, é dentro de si mesma que deve procurar a razão.
Reage. Enxuga as lágrimas e promete a si mesma que vai tentar juntar seus pedaços. Reunir a turma será o primeiro passo. Vai ser difícil achar todo mundo – talvez pelo Orkut. Ela sabe que, mesmo entre aqueles que forem localizados, muitos não se farão disponíveis. Não importa. O que vale agora é que existe esperança.
Marília continua só. Mas, de repente, está aberta para a vida. Novamente assume as rédeas do seu destino e programa os encontros que terá pela frente. Serão prazerosos? Frutíferos? Ela não sabe. Sua única certeza é a de que eles serão os encontros possíveis.

Abril, 2008

terça-feira, 1 de abril de 2008

Estou tendo enormes atritos com uma urucubaca que baixou por aqui. Não consigo mandar mensagens para o pessoal do meu grupo no yahoo. Esse é o grupo denominado de Oficina Literária Independente e Democrática. Na penúltima reunião que fizemos, falamos tanto sobre terapia e terapias que este ficou sendo o tema sobre o qual escreveríamos para apresentar na reunião seguinte. Funciona assim: cada um lê o que escreveu e depois coloca o texto no yahoo para que os que não foram possam ler. Desde a última quinta-feira tento enviar meu texto e ele se recusa a ir. Acho que ele tem personalidade própria. Mas como sou teimosa, vou postá-lo aqui e dar um jeito de avisar ao pessoal para vir me visitar.
Aí vai:

TERAPIA?

Sylvia Regina Marin

Quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

- Meu último dia de férias – pensa Lê – enquanto remexe nas gavetas da mesinha de cabeceira.
Ah! Enfim acha o que procura. Um pedaço de papel onde escreveu, durante a festa do Reveillon, as promessas de fim de ano – tudo que ela estava adiando há algum tempo e se comprometia a realizar no ano seguinte.
Pega uma caneta e se recosta em sua poltrona favorita.
- Ainda bem que o João Pedro foi ao supermercado fazer as compras de mês. Esse meu maridinho é um anjo. As crianças só voltam à noite da colônia de férias. Então, deixa eu aproveitar para checar minha lista. Vamos ver:
- Voltar para a academia de ginástica - Ha!ha! Voltei há duas semanas. Riscado.
- Visitar minha sogra duas vezes por mês - Hum! Só fui uma vez em janeiro; fevereiro é um mês curto... em março, eu começo de verdade.
- Marcar ginecologista - Feito. Tudo bem lá por baixo. Riscado.
- Fazer um peeling de cristal – Só no inverno, disse a dermatologista. Está bem.
- Fazer terapia.
Lê esbarra nesse item. Ela acha que não precisa dessas coisas. É uma pessoa feliz, sempre com o astral nas alturas, tem um marido maravilhoso (em todos os quesitos), trabalha no que gosta, ganha bem, os filhos são saudáveis e inteligentes, sua casa é confortável... Sim, tem seus problemas, como todo mundo, mas trata de resolvê-los rapidamente para ficar livre. Nada que não termine com uma sonora gargalhada, e pronto.
Sua irmã mais velha, porém, sempre que pode, insiste para que ela procure um terapeuta:
- A terapia funciona como um instrumento para as pessoas se conhecerem melhor. Isto é muito importante na vida. Veja o meu caso. Há vinte anos me consulto com o Dr. Mascarenhas e, a cada dia, descubro coisas novas a meu respeito, coisas que estão escondidas no subconsciente.
Lê não quer seguir os passos da irmã e ficar tantos anos presa a uma pessoa. Mas não nega que tem uma certa curiosidade sobre o assunto. Já andou pesquisando e decidiu marcar uma hora com a terapeuta holística de sua amiga Lídia.

Segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Lê toca a campainha do consultório da Dra. Mônica. Surpreende-se ao encontrar uma mulher com roupas indianas, cabelos longos e um sorriso encantador, que lhe pede para tirar os sapatos. Sente-se confortável naquele ambiente. A música relaxante e o barulhinho da água que jorra de uma fonte fazem sua mente vibrar em uma sintonia de amor.
Dra. Mônica pergunta seu nome completo e ela responde:
- Legiomar Sylvianna Becademy da Silva, mas pode me chamar de Lê.
- Ora, um pouco estranho seu nome, não é? Você gosta dele?
- Bem, não posso dizer que adoro, mas estou acostumada.
- Alguma vez zombaram de você por causa disso? Na escola ou em família?
- É, já aconteceu...
- Você teve ódio de sua mãe por ter lhe dado esse nome?
- Não, isso nunca me passou pela cabeça, mas... pensando bem...
- E seu pai? Será que foi idéia dele? Seus pais brigavam muito?
- Eles se separaram logo depois que eu nasci.
- E você acha que seu nascimento teve algo a ver com essa separação?
- Não sei...
- Relaxe, me fale sobre as coisas que você se lembra da infância, sem se preocupar com a ordem dos fatos.

Segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008
- Como vai, Lê? Gostei de ver. Você é pontual.
- Tudo bem, Dra. Mônica? Tive um sonho estranho esta noite.
- Conte.
- Sonhei que estava na praia e de repente tirava a roupa toda e entrava nua no mar. As ondas eram muito altas e eu não conseguia voltar para a beira. Nadava desesperadamente até que apareceu um tubarão. Em vez de me atacar, ele me carregou nas costas até uma ilha deserta e me deixou lá.
- Hum... Águas revoltas... Precisamos cuidar urgente do seu emocional. Você se sentia bem nessa ilha?
- Claro, depois de quase morrer afogada e do susto com o tubarão, a ilha era um paraíso.
- É bem nítido que existe um problema de relacionamento com seu marido. Falta alguma coisa no casamento? Quais são os defeitos dele que irritam você? Fale tudo que vier à cabeça.


Segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008
- Dra. Mônica, estou muito chateada. Briguei com a Rebeca, minha irmã. Ela acha que sua terapia anda muito rápido e está confundindo a minha cabeça.
- Fale-me sobre sua irmã.
- Ela é psicanalista kleiniana. Sempre foi a primeira da turma. Muito inteligente e autoritária. Adora mandar nos outros.
- Minha querida, vejo que temos um importante material para trabalhar. Você tem inveja de sua irmã, sente-se inferior a ela. Por isso, ela manda e você obedece.
- Não, doutora, eu disse que ela gosta de mandar, mas não disse que eu obedeço.
- Inconscientemente, obedece sim. Veja bem...

Segunda-feira, 3 de março de 2008
- Dra. Mônica, não vim me consultar hoje. Vim me despedir.
- O que houve? Estávamos indo tão bem...
- Pedi demissão do emprego, vendi meu carro, me despedi do João Pedro e das crianças e comprei passagem só de ida para o Nepal. A louca da minha irmã diz que eu pirei, veja só... Agradeço à senhora ter me mostrado quem eu sou realmente. Minha vida era uma farsa. Sei que estou deprimida, mas com o tempo isso vai passar. Adeus!
- Mas, Lê, ainda faltavam tantas coisas para você descobrir...

Março de 2008

Notas da Autora:
1) O nome “Legiomar Sylvianna Becademy da Silva” é uma homenagem aos participantes da Oficina Literária Independente e Democrática, que se reúne duas vezes por mês na casa da Myriam.
Vejam só: “Legiomar” se forma com as primeiras letras dos nomes Letícia, Giovanna e Márcia; “Sylvianna” se forma com as primeiras letras dos nomes Sylvia, Vilma e Anna (esse foi todo); “Becademy” se forma com as primeiras letras de Bete, Catarina, Dede (sempre presente, apesar da distância) e Myriam. O “da Silva” homenageia nosso querido Vlad.

2) O texto é obviamente uma brincadeira e não faz jus ao trabalho sério de inúmeros terapeutas, de todas as linhas, que nos ajudam bastante a desatar os nós com os quais nos enroscamos durante a vida.